segunda-feira, 22 de novembro de 2010

.. silêncio - Clarice Lispector

É estranho como não se fala sobre nosso silêncio interior. Temos um misto de vergonha e medo, porque ele é inexplicável e acreditamos que o outro não nos vai entender, pois, mesmo que também o tenha, não admitirá. Mas, chega o momento em que se aceita o silêncio como o destino final da jornada vivida e, amparado pela coragem, se entra nele e vive o silêncio como se tudo vivido antes fosse um ensaio para o que se viveria agora. O silêncio total, o vasto silêncio de quando nos deixamos reconhecer, só chega quando nada mais pode atrapalhá-lo e ele, introspectivo, não sente temor de se mostrar e se assumir como realmente é. Ocorre o medo de ter o desabrochar, despertado pelo silêncio, interrompido por algum som desavisado que se propaga no mundo exterior, mas não repercute em nosso interior. E então o silêncio chega, aquele silêncio que, nas horas de maior ardor, imaginamos como o amante proibido e que se revela como nosso algoz, pois não chega para a troca de confidências e sim para nos fazer calar, enquanto aperta sem piedade nossas feridas. Mas, o dia raiará novamente e o silêncio irá dormir, e sua passagem pela noite será apenas uma lembrança a espiá-lo pela fresta de uma memória sentida, do tempo passado em comunicação aterrorizadora consigo mesmo. E, nesse momento, o silêncio será mais um fantasma dentre tantos na vida.

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